terça-feira, 26 de dezembro de 2006

Meu filho


- Adora chá! - comenta Elenir, sobre a filha, como se confessasse um crime. A revelação de uma preferência da filha que é o maior tesouro da assistente social pode ser considerada banal. E talvez seja. Mas revela muito daquela adolescente de 16 anos que Elenir ama tanto. A expressão dela ao fazer esse comentário ecoa até hoje na minha memória. Fabiana, a filha, é negra e tem cabelos cacheados curtos que preserva presos. Essas características também podem descrever Maristela, 19 anos.

A jovem vive isolada em seu mundo introspectivo, mas aos poucos revelou suas histórias e aflições. A mãe, Miriam, é uma prática advogada que tem dificuldades de dialogar e de enfrentar os problemas emocionais da filha.

A jovem gosta de rap, o ritmo de protesto da periferia que também agrada Ezequiel. Um anjo torto que vive hoje nas sombras dos becos de Cuiabá. Ele teve uma tentativa de adoção pela família de Silvia. Uma conselheira tutelar, que assim como Elenir é assistente social. Entretanto, o garoto não suportou as regras impostas pela família e foi em busca do pai biológico. Acabou voltando para as ruas, mas dessa vez em uma cidade desconhecida.

Ezequiel, 13 anos, tem outra característica em comum com Maristela: ele luta judô. Os dois são elogiados na prática dessa arte marcial. Gabriel, 6 anos, praticava outra arte marcial, o karatê. Mas desistiu após não poder fazer a prova de troca de faixas. A mãe Soila e o pai Geraldo, foram quem frearam o menino após ele cometer uma de suas traquinagens. O casal é rígido na educação, mas também são muito carinhosos e amam muito os filhos. Hoje Gabriel prefere brincar de futebol e cavalgar na fazenda ao lado da irmã Larissa de três anos.

A menina loira e amável é carinhosa, assim como Amadeus que tem essas mesmas características e a mesma idade que ela. O menino, junto com a irmã Graziele, 6 anos, é o xodó da casa de Stephan e Sueli. Graziele, assim como Gabriel e muitas outras crianças brasileiras, adora Rebelde. O grupo mexicano que tem novela de mesmo nome no SBT.

Às 6h30 da manhã, Elenir prepara as coisas de Fabiana para irem juntas para escola. Soila faz queijo, mas já preparou o café e arrumou a cozinha. Sueli também arruma Grazieli para levá-la a escola. Silvia desperta e pensa no dia cheio de trabalho que terá no conselho tutelar. Enquanto isso, Miriam ainda dorme mais um pouco e só levanta às 7h, quando segue para o trabalho. Essas cinco mulheres são donas-de-casa, trabalhadoras, guerreiras, mas acima de tudo mães!

Mães de filhos que nasceram do amor. Amor "ocasional", que nasceu numa visita ao abrigo Vovó Túlia, como é o caso de Elenir, Soila e Miriam. "Ocasional" também foi o encontro de Silvia e Ezequiel e de Sueli e Stephan que adotou uma família toda (ou foi adotado?). Mas quem acredita em ocasionalidade? Coincidência? Eu prefiro acreditar no destino...

Essas cinco histórias tem Campo Grande como eixo de ligação. São vidas que correm paralelamente e às vezes se cruzam, só para depois continuarem correndo cada uma o seu caminho. Assim, acontece quando Miriam visita no Marco (Museu de Arte Contemporânea) a exposição de fotos de Stephan. Ou quando Elenir chega ao IBISS logo após a saída do suíço. Ela faz consultoria na ong que é parceira da Girassolidário, agência de notícias que Stephan preside.

Miriam tem uma amiga que trabalha no IBISS, e assim como Elenir, já teve um fusca no passado. Elenir conta com o irmão Marcelo para cuidar de Fabiana. Cabeleireiro, o padrinho da adolescente, já precisou da ajuda de Scarlet, uma amiga, para pegar Fabiana na escola. Scarlet é de Anhanduí, distrito próximo à fazenda e Soila e Geraldo que conhecem a travesti de vista. O casal trata as doenças dos filhos através da homeopatia, como também faz Stephan e Elenir.

Você deve estar confuso com tantos nomes. Não deve mais saber quem é quem. Ou pode estar achando que com tantos pontos parecidos as histórias sejam todas iguais. Engano grande. As vidas dessas cinco famílias são muito ricas, particulares, cheias de especificidades, no entanto, em alguns momentos se parecem, se afunilam.

Essas histórias foram compartilhadas pelas famílias à Laiana e eu. Foram quatro meses em contato com essas pessoas, vivendo um pouco de suas rotinas, compartilhando um pouco de suas vidas. Tudo isso para fazermos o nosso projeto experimental, exigido para concluir o curso de jornalismo na UFMS. Ah! Sim, o nosso tema é adoção. Um livro de cinco histórias de famílias que tem adoção em seu histórico.

Tudo foi muito intuitivo nesse trabalho. A escolha do tema, que veio depois de defirmos essa parceria - a dupla. Hoje, vejo que jamais faria projeto experimental com outra pessoa que não Laiana. Não daria tão certo. O tema até pensei em desistir quando descobri um outro projeto que iria trabalhar com o mesmo assunto. Contudo, a adoção já tinha me escolhido.

Assim aconteceram com nossas histórias. Elas nos escolheram. Elas vieram ao nosso encontro. Esse trabalho foi um encontro de boas histórias, pessoas incríveis e dois jovens jornalistas em formação com sede de escreverem narrativas. Críticos com nossos textos que muitas vezes chegamos a julgar pobres.

Para muitos é uma tarefa hercúlea escrever a quatro mãos. Para mim e pra Laiana foi até tranqüilo. Foi muito mais difícil, por exemplo, ter que ter transcrever as fitas das gravações ou ainda enfrentar o cansaço do dia-a-dia do trabalho e mesmo assim ter inspiração e criatividade para escrever um bom texto. Muitas vezes achei que não iríamos conseguir. Foi aí que contamos também com a sorte. Murphy tirou férias nesse período e até deu as caras em alguns momentos, mas o contornamos.

Laiana e eu tivemos muitas sacadas juntos, discordamos poucas vezes, em todas chegamos a um consenso. Cedemos, rimos, assistimos TV enquanto escrevíamos, nos entendemos pelo olhar, discutimos poucas vezes, e fizemos um livro que para nossa surpresa foi muito bem criticado. Não esperávamos tantos elogios - de verdade.

Eu, em alguns momentos, cheguei a ter crises internas, porque nosso livro não receberia prêmios, como a revista do Antônio, não seria usado como instrumento de conscientização como o guia sobre bulling, de Jéferson e Bruno, e nem era um produto nunca antes feito no Estado, como a revista especializada sobre o terceiro setor, feita por Maria Fernanda e Camila Abelha.

Hoje percebo que nosso livro joga luz sobre pessoas que nunca ganhariam espaço na grande mídia. Esses seres humanos que praticaram um ato também humano, a adoção, no máximo seriam tratados como números. Humanização, narrativa e novo jornalismo. Esses foram nossos nortes. E enfim, Ijuim, entendi o que são as conexões.

Considero que nossa "obra" possa contribuir ainda com aqueles que querem adotar. Mas mais que isso são o retrato de histórias de vidas, que foram escritas assim: com vida. Construímos o que pra nós é o jornalismo, a arte de contar histórias, a história do cotidiano.

Essas vivências estão impressas no livro "EnCOMtro - histórias de pessoas que ganharam uma nova família" que na banca de avaliação foi elogiado pelos professores e jornalistas Mauro Silveira, Jorge Ijuim e Moema Urquiza. (sinceramente não sei se o livro é tudo aquilo, mas se eles disseram...). Hoje a obra está à venda por R$ 22.

Muitas dessas experiências levo pra vida toda. Ensinamentos que tive em contato com essas pessoas, na produção desse trabalho. E um dia pretendo também adotar um (a) filha (a). Gostaria de agradecer novamente a todos aqueles que contribuíram. Não se faz nada sem os amigos e nessa trajetória descobri que tenho alguns com quem sempre posso contar e que esse é o bem mais precioso que temos na vida! Desejo que em 2007 a vida e o destino proporcionem muitos encontros com esses amigos!

Valeu a pena!


Entre Aspas 1:

Escrever um livro

Eu quero escrever um livro

Pra dele me envergonhar um dia

Pra guardar na estante

Pra quase ninguém ler

Pra me sentir um intelectual (medíocre)

Pra me gabar modestamente

Para outros saberem quem sou...

Escrevendo somos transparentes

Sou bom, sou ruim, sou eu mesmo! (15/07/06)

GSD

Entre Aspas 2: Escrever é posar nu. Tudo ali é você, sem roupas, despido para que todo mundo possa ver e ler como quiser. Carlos Moraes/ GSD.

segunda-feira, 10 de julho de 2006

(Fora da) Normalidade

Ela era uma menina. Quantos anos teria? Tinha uma espécie de corcunda para frente. Uns cinco anos, talvez? Queria água. Não alcançava o bebedouro. Sua mãe enchia o copo enquanto ela com seus olhos tristes observava outra menina da mesma idade. A mãe da outra menina agarrava-a pela cintura e debruçava-a sobre o bebedouro. Como era gostosa aquela água pensava a menina "especial"* enquanto sentia mais sede e esperava a sua água.

Por alguns segundos ela se transferiu de corpo...Voltando a realidade pegou seu copo de alumínio e bebeu sua água. Os olhos das pessoas que passavam eram todos voltados para ela. Pena, dó, compaixão? Todos olhavam, menos eu. Adoro, nessas situações, ver como as pessoas reagem. Todos a olhavam e, eu olhava a todos.

A outra menina terminara de beber sua água e ia embora sem saber o quão era feliz. O quanto era bom poder brincar, pular e, principalmente ser "normal", não chamar para si olhares piedosos.

O pequeno e frágil ser tomou ainda mais um copo d'água. Agora eu evitava olhar para ela. Seria mais um reparando na menina. Depois que ela se foi percebi que estava de óculos escuros e que podia olhar a vontade.

Era quinta. 16h15 da tarde, Terminal Guaicurus, e eu depois de muito tempo ia para casa sem ter "nada a fazer". Já havia cochilado no ônibus anterior e tomado sorvete naquele mesmo terminal. O sol estava baixando. Estava no meu momento pleno de felicidade...

Aquela menina mexeu comigo. Não por ela. Mas, pelas outras pessoas. Nós é que fazemos o outro diferente, o nosso olhar, o nosso julgamento, a nossa "piedade". A hipocrisia da nossa falsa normalidade.

*odeio essa palavra, ela foi usada ironicamente.

Entre Aspas: Felicidade é um quantum de igualdade e um quantum de diferença. Divagações de Estela Scândola.

terça-feira, 27 de junho de 2006

Entrevista com Bruno Moser Canhete

Quem é o Bruno? Um novo desconhecido a cada dia. É assim que ele se define, lembrando que não gosta de falar muito sobre si. Você pode passar horas conversando com Bruno, porém pouco ele vai revelar sobre si. Nascido em Corumbá, que como ele diz, é cheia de figuras, o Bruno é mais uma delas: engraçado por natureza, artista e comunicativo. Na infância, queria ser médico. Ele se divertiu muito e deu muitas risadas quando era criança. A separação dos pais veio junto com a adolescência e depois vieram alguns trabalhos não muito bem-sucedidos. O que importa pra ele é fazer o que gosta e não o dinheiro. Jornalismo? "É quando você trabalha a favor da comunidade", acredita. O Futuro? "Eu não fico planejando coisas", afirma. Conheça um pouco mais deste desconhecido na entrevista a seguir (realizada em 24 de abril em um dos bancos de concreto da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul – UFMS):

Guilherme - Eu queria que você se apresentasse, falasse seu nome e idade.
Bruno
- Meu nome é Bruno Moser Cañete. Eu tenho 25 anos, nasci em Corumbá, em 6 de dezembro de 1980.

Gui - O que você faz da vida?
Bruno
- Eu, atualmente, estou cursando o 4º ano de jornalismo aqui na Universidade Federal. Pretendo ano que vem, se Deus quiser, trabalhar nessa área.

Gui - Além de cursar o 4º ano de jornalismo o que mais você faz?
Bruno
- Olha, eu não estou trabalhando, por enquanto. Também não estou procurando, mas tudo que aparecer de projeto interessante, que eu me identifico, eu estou fazendo. Estou tocando em uma banda, e participando, mais ou menos, da edição de um filme. E o que vier nesse sentido de arte, eu estou fazendo.

Gui - Como é o nome da sua banda, o que ela toca?
Bruno
- Eu tenho uma banda de garagem que não sai da garagem. A gente toca músicas dos anos 80, de um período pós-Punk, aí tem The Kirls, The Smith, todos os "Thes" da vida. A gente toca também Take Spitous. Eu toco baixo na banda e a banda não tem nome. A gente está procurando nome ainda, mas estamos em definições de componentes e tal. Mas quem sabe eu entre em uma outra também, aí eu vou cantar. A gente está esperando um baterista bom, só isso.

Gui - Então você é multifacetado, faz tudo?
Bruno
- É, eu faço de tudo um pouco. Quase nada dá certo, mas aquilo que eu faço com mais afinco dá até certo, funciona, funciona. Eu não fico me prendendo 'ah tenho que fazer alguma coisa', o que vier eu estou fazendo.

Gui - Eu queria que você contasse como foi sua infância, do que você brincava?
Bruno
- Infância cara... Foi uma infância bem legal. Não que eu tenha feito tudo que eu quis, por que depois que você cresce você vê que deixou de fazer um monte de coisas. Mas, enquanto eu era criança eu curti bastante. A única coisa que eu sinto falta é de não ter tido...sabe aqueles carrinhos que você pedala dentro.

Gui - Rolimã?
Bruno
– Não. É um carrinho, com forma de carrinho mesmo, que tem um pedalinho dentro. Aquilo eu não tive, até hoje eu tenho uma... Eu sou uma criança frustrada porque eu não tive isso.

Nesse momento meu celular toca. Paro a gravação e atendo. Tinha que ser a Laiana. Ela quer aparecer em todas as entrevistas mesmo.... Depois volto a entrevista.

Gui - Você estava falando do seu carrinho, da sua infância.
Bruno
- Então a parte do carrinho foi complicada. Mas eu viajava bastante quando era criança. Eu ia para a casa da minha avó em Santa Catarina, lá eu brincava bastante. O ano inteiro ficava em função dessa viajem. Durante o ano em Corumbá, eu tinha bastante vizinhos, a gente brincava. Como eu morava em bairro, jogávamos bola...

Gui - Vocês iam para o rio também? Como é ter infância em uma cidade que tem rio? Eu não sei como é isso.
Bruno
- Bom, a parte do rio eu não lembro muito. Eu não fui. Eu não cresci dentro do rio. Tenho bastante amigos que tiveram essa vivência. Mas era mais para quem tinha tio, e eu não tinha tio. Eu só tenho uma tia por parte de pai, né? E os outros parentes da minha mãe moram em outros estados. Então, eu não tive muito essa relação de sair para pescar.

Gui - Porque tem que ser com tio? Por causa da pesca?
Bruno
- É, porque o pessoal vai lá pescar, tem essa relação mais íntima com o rio. Tomar banho eu nunca... Eu não lembro de ter feito isso. A gente brincava nas pracinhas, mas o rio...

Gui - Não tomava banho [no rio], né?
Bruno
– Não, eu não curti isso. Depois de velho que eu fui pescar, mas eu não sei pescar até hoje. Eu gosto de remar, mas eu nunca fui bom com bola, pra jogar bola. Esses esportes coletivos, eu nunca fui bom. O que eu fazia, quando eu era criança, nadei até uns dez anos. De uns oito aos dez, aos doze, não sei. Aí, cresci, meus pais logo separaram e fui morar para o centro da cidade. Aí eu perdi um pouco essa relação com o pessoal do bairro. Mas a infância em si foi muito boa. Não tenho nada do que reclamar. Ri muito. Isso eu lembro bastante, da família reunida, eu, minha irmã, meu pai e minha mãe, a gente brincando e rindo bastante. Rindo de doer a barriga, isso eu lembro. Acho que por causa disso eu sou meio palhação. A família inteira é bem alegre.

Gui - E como foi a adolescência, os primeiros namoros?
Bruno
– É, adolescência foi mais complicada porque na época que mais pais se separaram eu estava com 12 anos. Então, foi bem complicado. Foi a época em que eles se separaram e eu fui morar com meu pai. Eu resolvi morar com meu pai e um ou dois anos depois, minha mãe foi morar em Joinvilhe [Santa Catarina], foi embora. É interessante que tem certos momentos que não lembro. Eu exclui assim, sabe? Não sei por que, mas eu não lembro. Não sei quando a minha mãe foi embora exatamente, que ano ela foi, que mês ela foi. Eu não sei quando fui morar com meu pai certinho. Então, foi um período meio estranho. Dos 13, eu acho, até os 16 eu fiquei morando com a minha primeira madrasta, por que meu pai está na segunda madrasta já. Fiquei com ela e foi um período complicado, porque a gente brigava muito. A gente não tinha uma relação muito harmoniosa. Com 16 anos, eu tive minha primeira paixão, mas não foi concretizada. Foi uma paixão platônica, mas foi muito forte.

Gui - Com 16 anos... Tarde né?
Bruno
- Não foi bom porque você vê gente tendo essas paixonites de escola mais tarde, com 18, 19, que é complicado. É pior para você trabalhar, quando você é mais novo. Acho que é mais fácil de você trabalhar. Com 17 anos, eu fui morar em outra casa que culminou com a saída da escola. Foi meu último ano, foi o terceiro ano e logo depois eu vim para Campo Grande. Vim fazer faculdade já. Fiz um ano de Análise de Sistemas aqui, voltei para Corumbá, fiquei de 99 até 2003 nesse limbo assim, arranjando um trabalhinho aqui outro ali...

Gui - Que tipo de trabalho?
Bruno
- Eu trabalhei... Cara, eu trabalhei como vendedor que não tinha hora para você fazer, você fazia o seu trabalho. Então, eu trabalhei vendendo consórcio de carro, não vendi nada. Trabalhei vendendo plano de saúde, vendi um plano de saúde um só.

Gui - (rindo) Recebeu uma comissão...
Bruno
- Recebi metade, por que eu vendi junto com outro amigo meu. Esse foi um trabalho meio rápido. Vendi plano de saúde para uma outra empresa também que não deu muito certo. São esses empregos mais ou menos. Nunca fui muito afeito ao serviço. Ah! E antes disso, quando eu era bem novinho, eu trabalhei na farmácia que meu pai trabalha. Meu pai trabalha em uma farmácia, é gerente. Eu ajudei ele lá.

Gui - A "São Bento" de Corumbá?
Bruno
- Não, a Santo Antônio. É, desculpe, a Santo Antônio é a "São Bento" de Corumbá. Fiquei trabalhando alguns meses lá. O patrão é o meu padrinho. É uma relação bem legal. Um dia eu estava lá no estoque deitado em cima de umas fraldas, tá ligado? Matando tempo, aí o patrão me sobe e me vê em uma situação toda constrangedora, aí eu saí. Aí lá, eu ganhei um salário até, mas não fazia diferença para mim. Eu não gastava naaadaaa. Eu estava até conversando hoje que eu não tenho muito essa relação com o dinheiro. Não faz muita diferença para mim, nunca fez. Então, a relação com o trabalho é mais prazer do que dinheiro. Eu só executo bem uma tarefa que eu tenho prazer em fazer. Se eu não tiver prazer, não adianta pagar bem que eu não vou fazer.

Gui - Por que você escolheu fazer o curso de Jornalismo?
Bruno
- Foi muito graças ao fato de ter feito um ano de Análises de Sistemas aqui. Porque eu fiz meu primeiro vestibular, que foi para análises, e eu passei direto. Meu pai falou 'cara, parabéns, vai fazer, tal'. E eu fiz análises muito por essa parte: eu vou fazer por que dá dinheiro. Eu gosto de mexer no Word, gosto de jogar Paciência, então eu vou fazer. Chegando aqui, dei de cara com um curso extremamente complicado, extremamente de cálculo. E eu reprovei logo no primeiro semestre. Eu já estava reprovado, tirei uma nota azul só. Foi um baque tremendo, sabe? Quando você é jogado aos leões. Aí, dali eu percebi e falei 'cara, meu negócio não é exatas'. Disso eu tenho certeza absoluta em qualquer tipo. Aí, como eu percebi mais facilidade com Português, com essas paradas mais Humanas, e todo mundo falando que eu tinha facilidade para me comunicar, resolvi fazer Jornalismo. Comecei a tentar fazer Jornalismo, desde que eu voltei. Só passei em 2003. Fiz uns três, quatro vestibulares até conseguir passar.

Gui - Agora, eu queria que você se definisse. Bruno por Bruno. Quem é o Bruno?
Bruno
- Olha, eu não sei te dizer isso assim certo. Porque antigamente eu achava que sabia o que eu queria, o que eu era, mas fui conversando... Voltar para cá, para Campo grande, para fazer esse curso foi interessante. Eu comecei a conhecer bastante gente assim, gente diferente. E eu comecei a perceber que ninguém me conhecia. Até se eu perguntar para você do que eu gosto você não vai saber, uma comida. Até com você que eu não tenho uma relação tão íntima é até normal. Mas pra gente que eu convivia diariamente, não sabia o que eu era. Eu não sei. Agora eu estou começando a me definir e a mostrar isso. 'É disso que eu gosto, saibam disso'. É igual está no meu Orkut, um novo desconhecido a cada dia. Eu não sei te falar, eu não consigo precisar muito as coisas. Conheci muita gente que é muito precisa, muito objetiva, mas eu não consigo ser assim. Não sei porque eu não consigo ser assim.

Gui - Mas, do que você gosta? Qual comida você gosta, quais filmes você curte?
Bruno
- Pois é, justamente, esse negócio é muito complicado. Eu sou muito volúvel pra essa questão. Um dia eu gosto muito de panqueca e no outro eu amo arroz carreteiro e no outro eu estou comendo lagosta. Até a Manuela me perguntou outro dia: ‘qual é a sua música preferida’, eu falei eu gosto muito de 'Hotel Califórnia'. Ela falou 'Ah! Legal beleza', mas no outro dia eu estava extremamente apaixonado por Pink Floyd. Então, depende muito. Eu estou começando a me definir, mas ao mesmo tempo você começa a perceber que não tem sentido você ficar se definindo só pra se definir. Por quê? Pra quê? Aí eu devolvo a pergunta: 'Qual é a comida que eu gosto? Mas pra quê que eu preciso gostar de uma comida?'. Não sei, eu estou tentando definir algumas coisas, simplesmente para responder algumas questões. Mas eu por mim mesmo não faz diferença.

Gui - Como é a sua relação comigo?
Bruno
- Com você?...

Gui - Comigo!
Bruno
- Olha, nossa, não é...

Gui - Meio distante né?!
Bruno
- Não, não é tão distante. Mas, a gente não se encontra muito pra sair tal, essas coisas. Eu acho que talvez é por afinidade mesmo assim. Coisas que você faz que talvez eu não faça. E coisas que eu faço e talvez não corroborem com você. Você foi no [Bar] Fly aquele dia, quantas vezes você vai ao Fly?

Gui - Poucas.
Bruno
- Poucas vezes. Então, é muito difícil a gente se encontrar fora da faculdade...Mas, acho que você é uma pessoa extremamente interessante, extremamente legal. Até fico meio assim da gente não ter mais coisas, sei lá. Acho que é por afinidade mesmo.

Gui - Como eu sou? Críticas e elogios.
Bruno
- Olha, eu acho... elogios: que você é uma pessoa muito esforçada, que trabalha muito, acho isso muito legal. Acho isso um ponto muito interessante da personalidade. Eu falo de ver você trabalhar, vender. Essas coisas são coisas pequenas, mas são características da personalidade, que você percebe, de perseverança. Uma coisa que eu não tenho. De coisa negativa, eu não posso falar, por que a gente não convive tanto. Eu costumo não falar... Categoricamente, criar uma idéia contrária da pessoa se eu não conheço. Eu posso falar isso de brincadeira. 'Ah! O Guilherme, não sei o quê, não sei o quê..', mas eu não conheço, eu não posso te afirmar, pelo fato de a gente não ter esse relacionamento tão intimo. A primeira vista, você é uma pessoa que pra mim, eu não tenho absolutamente nada pra falar contra você. Talvez, só quando reuni a galera toda você, a Maria Fernanda e a Marina que começa todo mundo conversar, mas eu não posso falar isso que eu também converso. Então, fica elas por elas.

Gui - Que tipo de conversa?
Bruno
– Conversas. Sabe quando a gente está na sala e todo mundo começa a conversar e fica blá, blá, blá...(risos)...é essa conversa.

Gui - Com quem você tem mais afinidade na faculdade e porquê?
Bruno
- Com quem eu tenho mais afinidade? Com quem eu tenho mais afinidade são as pessoas que eu saio mais. O Jéferson, obviamente, porque eu estava morando com ele. A Manuela, porque ela fez parte do meu círculo durante muito tempo, por estar namorando o Vítor, que é uma pessoa que mora na minha casa. Então ela sempre freqüentou a minha casa, e é uma pessoa que eu gosto muito também. O André por afinidade espiritual mesmo. Gosto muito do André. Agora, ano passado foi muito interessante. Acho que no 1º ano, acabei conhecendo bastante gente da turma que não estava comigo no ano passado, do 3º ano quando a sala dividiu. Então eu conheci bastante a Maria Fernanda, a gente andou tal. A Camila Abelha, esse pessoal ali da outra turma, Airton. Agora, ano passado foi fundamental pra conhecer esse pessoal que eu não conhecia. Estreitei minha relação com Antônio, que eu não via bastante, com Suzana, Terumi, Amanda, Thaís, esse pessoal que simplesmente não conhecia, não conversava. Então, esse ano, esse 4º ano eu me sinto mais integrado na turma do que todos os anos anteriores, por ter tido essa oportunidade mesmo de ter conhecido. Mas, pessoas do meu círculo, que eu saio bastante, que eu ando bastante é: Manuela, Jéferson, André. A Isabel, as vezes, por que eu gosto muito da Isabel também, e por que a gente formou um círculo por causa do Jeferson. São essas pessoas.

Gui - Qual é a área do jornalismo que você quer trabalhar quando você terminar a faculdade?
Bruno
- Edição. Rádio e TV. Quero trabalhar com edição de rádio e TV, embora eu goste muito de escrever, eu não consigo escrever um texto jornalístico. Não tenha essa...


Gui - Mas, você não tem vontade de escrever coisas humorísticas, colunas...?
Bruno
- É, é. Mas, eu não sei se jornalisticamente. Eu tenho medo depois de tudo que a gente conversou de escrever alguma coisa e falar que isso é jornalismo. Eu preciso dar mais consciência de mim, porque o jornalismo é uma arma extremamente poderosa e perigosa. Então, eu tenho medo de entrar para essa área e dizer 'isso aqui que eu estou fazendo é jornalismo'. Eu prefiro falar que é arte, outra coisa, mas não jornalismo.

Gui - Mas, por exemplo, José Simão você considera o quê?
Bruno
- Cara, o José Simão... Eu não sei... É... Ele é um cara que aproveita coisas bem ácidas assim.

Gui - Ele aproveita notícias para fazer um humor irônico, meio ácido.
Bruno
- É, eu não sei. Você acha que é jornalismo? Eu não sei se é jornalismo. Acho que é mais crítico, mas não sei o que é jornalismo. Não sei se é jornalismo.

Gui - O que é jornalismo pra você?
Bruno
- Acho que jornalismo é quando você... Eu tenho uma visão, meio do que a gente aprendeu aqui, meio utópica... É quando você tá a favor mesmo. Quando você trabalha com uma responsabilidade social, com ética, a favor da comunidade. Se não for a favor da comunidade acho que não...Essa música é muito boa 'Jeninho e Zepelin' do Chico Buarque.

Gui - Você trabalhou com edição no Festas e Eventos né?
Bruno
- Trabalhei um pouquinho lá, com edição, na verdade. Era para eu ter aprendido mais, mas eu não fiquei lá por muito tempo por causa daquela coisa: ‘se não me dá prazer eu não estou nem aí’. Então, eu achei que eu ia ganhar mais fazendo o 'Capisomen', editando. E agora tem um amigo meu que está montando um estúdio de edição de som, na casa dele. Então, eu vou colar mais nele pra ver se eu aprendo. Tudo que é parte de edição, eu acho mais interessante. Até no Projétil, eu prefiro ficar com edição. É melhor pra mim. É mais fácil.

Gui - Como você se vê daqui a 10 anos? Você vai ter 35, né?
Bruno
- 35, a gente tava conversando esses dias atrás, no aniversário da Manuela, inclusive. Foi dia...Ih! Esqueci o aniversário dela, desculpa Manuela.

Gui - O que você vai ter feito? Vai estar em campo Grande?
Bruno
- Pois é, aí, eu falei cara, o que a gente vai fazer daqui a 10 anos. 35 anos é foda! São 35 anos, não é pra qualquer um. Eu espero estar trabalhando com alguma coisa que eu goste de fazer. Eu só não quero ficar preso a um salário, por melhor que seja. Mas eu não quero ficar preso a um salário por ter que pagar conta. Não, por mais que eu ganhe R$ 300. Por mais que eu ganhe um salário, eu quero estar bem. Não quero estar dentro do redemoinho da vida fazendo coisas que... Claro, que chega uma hora que você tem de fazer. Mas o que eu puder evitar isso, eu quero. Então, com 35 anos, eu quero estar trabalhando bem, não sei o quê eu vou estar fazendo.

Gui - Mas o que você já vai ter feito? O que já vai ter realizado? Vai estar casado, vai ter filhos, com que já vai ter trabalhado. Bem sonho mesmo.
Bruno
- Ah! Tá. Porra, que chato isso, não poder falar. Eu não sei cara. Eu não fico planejando coisas. Eu quero muito ter um filho. Quero muito ter filhos, na verdade. Mas eu não sei, eu não fico pensando muito em... Quero um idealismo, uma mulher linda, maravilhosa, gostosa do meu lado. Mas se não tiver, eu penso muito em filhos. Não penso em casamento, mas eu penso em filhos, eu penso em ter uns dois ou três.

Gui - Você vai estar em Campo Grande?
Bruno
- Hum... Eu queria estar, aí já fica legal, eu queria estar em Florianópolis. Morando lá, pegando uma prainha. Mas se aqui aparecer coisa legal para fazer assim, e eu já estou me adaptando aqui. Já estou há quatro anos aqui, eu ficaria por aqui. É uma cidade muito boa, muito boa mesmo. Eu queria estar em Florianópolis, porque é bem tranquilinha.

Gui - Como você analisa o jornalismo de uma maneira geral?
Bruno
- Olha, o jornalismo a gente vê cara, e conversas com pessoas... Partindo daqui do estado, é o que todo mundo fala realmente, e o que a gente consegue constatar: que não é bom. De uma maneira geral, não é bom. TV, impresso, on-line, ele é falho. Mas, eu acho que é aquela contradição que existe em todas as áreas no Brasil. Tem muita gente fazendo coisa ruim, mas tem uma parcela fazendo muita coisa boa e conflita por que a parcela ruim consegue muito mais coisa porque tem mais poder, tem mais dinheiro e ganha mais dinheiro. E a parcela boa, não consegue fazer por que não tem voz, por mais que seja boa não tem voz. Não consegue, a política não ajuda. Então, é sempre trabalhando aos trancos e barrancos. Mas eu acho que o jornalismo está muito grudado, intrínseco ao que o povo pensa mesmo. E eu acho que o que o povo pensa, não faz com que ele consuma o jornalismo melhor. Embora, tenha muita demanda, tem muita gente fazendo coisa boa. Mas eu acho que o povo não está conseguindo absorver. Então é uma questão de tempo. Uma questão de política mesmo, de investir em educação. Fazer essas coisas que a gente sabe que tem que fazer, mas que não consegue fazer por motivos maiores, por não colocar gente que represente a gente bem. É uma parte mais política. Acho que jornalismo está muito junto a essas coisas, e as coisas tem de trabalhar em harmonia profissional, senão não funciona.

Gui - Como você avalia o governo Lula, esse primeiro governo dito de "esquerda" no Brasil?
Bruno
- Pois é, esse governo tá foda assim. Ele começou com muita esperança, o pessoal acreditando bastante.

Gui - Você votou no Lula?
Bruno
- Não, não votei no Lula. Eu votei no Serra né? Eu não votei no Lula porque eu tinha medo dele.

Gui - Você tinha medo do Lula?
Bruno
- Eu tinha medo do Lula, medo do personagem Lula. Não de toda a equipe que estava por trás disso, porque ele não trabalha sozinho. Mas, eu tinha medo dele, como pessoa, com o cara que não consegue se comunicar em outras línguas, essa coisa toda. Porque um presidente é uma instituição de fatores.

Gui - E esse medo se concretizou?
Bruno
- Pois é, eu acho que na pele dele, no personagem Lula, não. Mas tudo que veio atrás, acabou, sabe? E foi complicado porque passou uma rasteira quando você estava percebendo que aquilo podia representar uma mudança. Então, mais uma vez eu o povo todo se sentiu traído de novo, pelo governo e sentiu mais traído ainda porque é aquela parcela que falou 'não, vamos ver o que...Se todo mundo deu errado esse cara vai dar certo'. E deu errado pra caramba. Ele fez muita coisa, mas nada justifica essa bandalheira que aconteceu. E eu não sei se ele vai, embora as pesquisas mostrem que ele vai ficar. Eu não sei se ele vai continuar não.

Gui - Votar no Lula então...
Bruno
- Não, acho que não voto no Lula não. Mas, aí vou votar em quem? Porque votar no Alckmin eu não voto. Eu não conheço o Alckmin. É isso que é o complicado, porque eu acho da política é isso: não adianta você votar... Claro que adianta, mas não faz efeito votar em uma presidente sendo que você não sabe nem o que seu vereador está fazendo. Eu acho que tem que ser de trás para frente. Vereador, prefeito, deputado, senador, governador, presidente, para conseguir alguma mudança, senão você não consegue mudar. É do pequenininho para o grandão e não do grandão pro pequenininho.

Gui - Por exemplo, na Heloisa Helena, você votaria?
Bruno
- Pois é, cara eu preferiria votar em um vereador que eu conheço. Talvez eu votaria nela. Talvez seja até uma boa. Eu vou dar uma pesquisada mais na proposta dela para ver se ela está falando coisa com coisa. Mas eu prefiro votar em um cara que eu fale: 'esse cara vai representar bem o meu bairro, o meu espaço lá'. Porque é só assim, senão a gente não vai poder andar pra frente pensando da ponta pra baixo. É da base pra ponta, é assim que trabalha.

Gui - Como é Corumbá?
Bruno
- Cara, Corumbá é uma cidade extremamente interessante. É, eu já cheguei a conclusão que lá, como algumas cidades do interior, mas não sei se todas, tem muita gente figura. Aquelas pessoas de livro mesmo: o cara do saco, o dono do mercado, o açougueiro. Tem essas pessoas assim. E por outro lado, você vê que ela é uma cidade que está morrendo por mais que invistam nela, por que ela foi um pólo comercial muito importante, antes de Campo grande, antes de um monte de cidade do estado. O rio Paraguai era o que trazia cultura, era o que trazia dinheiro, era o que trazia tudo. Aí por administrações consecutivas e não muito competentes a gente foi ficando para trás, foi ficando para trás. Dividiu o Estado e a gente se perdeu mais ainda, e a gente sabe que...

Gui - A divisão do Estado não foi boa para Corumbá?
Bruno
- Para o Estado inteiro né. Para Mato Grosso do Sul como um todo não foi muito boa. Passou o centro de controle daqui [se referindo a Corumbá] para Campo Grande. O poder mesmo. Agora Corumbá está tentando se reerguer por que é difícil colocar em ordem bagunça do passado. Essas farras que aconteceram para o passado, farra fiscal mesmo. Agora está tentando se reerguer. E lá eu fico até meio assim, porque eu não vou para lá para votar. Esses quatro anos que eu estou aqui, eu não votei. Quando eu estava lá sim, eu procurava votar nas pessoas que eu conheço e que eu sabia que iam fazer alguma coisa pela cidade. Agora conseguiram criar um calendário turístico para cidade. De janeiro a dezembro sempre vai ter alguma coisa para fazer, mês sim, mês não, a cada dois meses. Mas sempre tem coisa pra fazer. Isso é interessante por que chama bastante gente para lá. A gente tem que trabalhar ainda mais para isso. Eu espero formar, e, se não der nada certo, voltar pra Corumbá e trabalhar lá dentro da prefeitura. Trabalhar como multiplicador de políticas boas, e não sair como candidato. Trabalhar nos bastidores porque a gente já está fazendo parte daquela geração que vai tomar conta. A gente não é mais o amanhã, a gente é o hoje. Então, eu já conheço gente que se formou em publicidade, direito, bababá, e porque não juntar toda essa gente, que a gente conhece, e trabalhar em função da cidade? Fazer aquela cidade funcionar, porque dá e dá de verdade. Basta querer. Como a gente mora lá e sente que a cidade precisa desse plus, desse mais, a minha a vontade é de voltar para lá se nada der certo.

Gui - Tem muita gente de Corumbá que vem para Campo Grande, estuda, se forma, se torna profissional e vem multiplicar em Campo Grande e não volta para Corumbá. Você tem vontade de voltar para Corumbá?
Bruno
- Olha, eu acho que eu voltaria se esses planos de mulher, filhos, Floripa, por algum motivo não funcionasse. É difícil você trabalhar em outro setor. A cidade tem um ritmo muito lento, se você fica lá, você acaba caindo nesse ritmo, se acomoda, não tem muitas oportunidades. Isso é complicado porque quando você volta lá, tá tudo igual. E tá todo mundo meio assim.

Gui - Ou está tudo pior né?
Bruno
- É, está todo mundo igual e só você está diferente. Então você fica meio fora, você fica excluído. Não excluído no sentido ruim da palavra. Mas você fica diferente. Você andou e o negócio ficou. Quando você volta parece que você não cabe mais ali. Então é um negócio complicado. Se a gente conseguir fazer um negócio interessante de juntar, se eu conseguisse perceber isso em amigos que estão se formando, eu voltaria para lá tranquilamente. Fora o calor, que não dá para acostumar.

Gui - Não dá? Você nasceu lá e não se acostumou com o calor?
Bruno
- De lá não. Quando tem muito calor, você reclama, reclama e reclama mesmo. Porque é muito quente.

Gui - E frio? Diz que é muito frio também?
Bruno
- Noossaa!!! É muito frio, nossa! Quando é calor arregaça. O sol faz assim chega meio-dia ele aproxima ba. (risos). Aí, quando é frio, nossa é muito frio. Nossa! É horrível, é horrível...

Gui - Como é morar em Campo Grande sozinho, sem os pais no seu caso?
Bruno
- Olha, eu já tive essa experiência quando eu vim para cá. Então, da primeira vez que eu morei aqui já deu... Embora eu tenha reprovado no meio do semestre, eu fiquei um ano aqui. Eu fiz um ano de análises [de sistemas], então esse foi o período da desmama. Já foi mais tranqüilo agora. E também quando eu vim pra cá a primeira vez eu tinha 17 anos e da segunda vez eu tinha 23. Então, se eu fosse pra Zâmbia talvez fosse mais fácil adequar ao lugar. Eu não tive muito problema com isso, mesmo porque depois que meu pai separou e dos 17 até... Eu vim pra cá e depois voltei pra lá, esse período todo eu sempre fiquei sozinho. Sempre fiquei sozinho em casa, sem muita gente. Então sempre me acostumei a ficar sozinho. Isso foi bem tranqüilo, não tive problema não. E até fico tirando sarro do povo. Quando eu voltei pra cá e era mais velho e tinha gente de tipo...Quantos você tinha quando entrou?

Gui - 17...
Bruno
- É, sabe. Eu tava com 23, pô. Então eu já sabia, o povo falava : (em tom debochado) 'ai! Eu estou com saudade da família', Eu falava 'Cala boca! Você não é nada'. Eu tirava onda era legal.

Gui - Da onde vem essa irreverência toda? Você se acha engraçado? Você faz coisas pra ser engraçado?
Bruno
- Cara, eu me achava mais engraçado. Eu acho que eu estou perdendo o jeito. Tô ficando... Eu percebo que antes eu podia conhecer uma pessoa agora e depois de 15 minutos ela já estava extremamente íntima, amiga e normal comigo. Agora eu sinto que eu posso conhecer uma pessoa, mas eu sinto vontade de ficar quieto, mais na minha. Isso é meio chato porque aí você num... Mas, eu acho que numa rodona se você me instigar eu ainda consigo, faço todo mundo rir, mas...

Gui - Da onde que vem essa irreverência?
Bruno
- Não sei... Eu acho que é da minha família. Minha mãe e meu pai são muito... Eles criavam um ambiente muito legal em casa, a minha irmã também é assim. Ela sempre foi a palhaça da roda dela, tal. Eu não sei acho que é de família, de família.

É isso aí. Obrigado Bruno. E até mais pessoal.

guilherme - 10:29:28
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sábado, 10 de junho de 2006

A batalha final: Os últimos dias do resto de nossas vidas

Ando cansado, minha cabeça não consegue processar um milésimo do trilhão de informações que recebo. São 18 horas e depois de um longo e tortuoso dia de trabalho ainda tenho que ir pra faculdade. Não agüento mais aula. Mas, quero continuar vendo os amigos. Está certo que estamos cada vez menos nos encontrando, cada vez mais cansados e estressados, mas somos amigos, nos divertimos juntos.

Estamos nos preparando para a reta final de nossa vida acadêmica, os últimos dias de aula do curso de jornalismo, do resto de nossas vidas. As últimas horas juntos rindo na cantina do Moita ou na escada. Depois, nunca mais todos juntos. Todos não vão morrer, mas cada um irá viver sua vida, encontrar seu caminho. O tempo e a distância vão chegar. E será que vamos conseguir fazer aqueles churrascos de encontro de turma? Será que temos de fazer isso? Será que queremos?

Vem aí a rotina profissional, o dia-a-dia, o fechamento, o dead line que já está aí. Não teremos mais a obrigação de ir pra faculdade, mas onde vou relaxar e dar boas risadas? Vou ter de encontrar novos amigos... Não será o mesmo. Dos professores ficarão saudades e causos engraçados. Nos corredores da federal ainda ecoarão nossos gritos. A gente não vai se esquecer, mas vai se perder. Vamos nos dispersar. Usando um clichê: somos lagartos que vamos ganhar asas, virar borboletas e voar. Vôo mais solitário, competitivo, sem muita proteção. Torço por todos. O que gostaria mesmo é que fôssemos um bando de pássaros daqueles que sempre voam juntos.

Como sonhei entrar na faculdade. Vivi intensamente, mas como diz a música queria ter aproveitado mais... Fui feliz, cresci, amadureci, ri, chorei. Errei, fui elogiado, vendi bombons, ri e conversei de novo. Aprendi, desaprendi, apreendi, boiei, compreendi. Saio outro, com outros sonhos, mais maduros agora, sem aquela revolução e frescor da adolescência (pena?). Saio para o jornalismo, que não é aquele que vim procurar. Saio para vida e quero todos vocês por perto. Mesmo sabendo que isso é uma utopia.

Eu disse...

No final de 2004, quando estávamos no 2º ano eu já previa: "No 4º ano a turma separada em dois no terceiro é uma de novo. Não adianta. A divisão física e mental já terá nos atingido de um tanto que nada nos unirá novamente. Além disso, 4º ano tem três meses de aula. E mesmo assim, cada qual fica com seu grupo. Vai ser sempre assim daqui para frente. Já é sempre assim. Mas, todos carregam sentimentos, são pessoas com vasto universo dentro de si, com milhões de coisas a serem descobertas e uma infinidade de outras para serem desvendadas juntas. Eu gosto de todos e quero compartilhar um pouco do mundo de cada um". É o que eu dizia na época, é o que eu sempre busquei na faculdade: conhecer diferentes realidades, me relacionar com outros seres humanos, mesmo os divergentes, os iguais, alguns que foram se tornando iguais e outros que se tornaram distantes.

Nesse tempo, o tempo não parou. O cabelo cresceu, encurtou, as espinhas se foram. Veio o aparelho, que também se foi, os empregos. Os namorados (as), acidentes, alegrias, tristezas, mudanças de casa, viagens. Mudamos. Reciclamos, amamos, corremos, brincamos, brigamos, tiramos fotos, escrevemos, falamos, ouvimos, trabalhamos, fomos nós mesmos e aproveitamos, cada um a sua maneira, cada momento.

O tempo não pára:

A mensagem foi dada aqui em junho de 2004, mas vale a pena repetir: "Uma luta, um jogo, uma algema constante com o tempo que não pára e que nos vence incessantemente e não nos 'dá um tempo' nem de respirar".

Tempo vago... uma confusão de pensamentos, idéias, ideais, coisas a se fazer, compromissos... Depois da crise e da ajuda dele (O Tempo) vem o amadurecimento, o crescimento. O tempo não pára... Então vamos correr atrás dele... Vamos à luta!"

Ente Aspas: Ando em crise, numa boa, nada de grave. Mas, ando em crise com o tempo. Que estranho 'presente' é este que vivemos hoje correndo sempre por nada, como se o tempo tivesse ficado mais rápido do que a vida, como se nossos músculos, ossos e sangue estivessem correndo atrás de um tempo mais rápido. Arnaldo Jabor.

Entre Aspas 2: Escrever é a minha única salvação, quando arranjo tempo para escrever é por que estou bem comigo mesmo. Bruno Moser/GSD.

PS: As crianças me chamam de tio. Os adolescentes se referem a mim como "o homem". Os adultos me tratam como o rapaz. E os velhos como o "menino". Quem sou eu?

Até mais, se o tempo, senhor da sabedoria, deixar.


guilherme - 00:52:23
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terça-feira, 9 de maio de 2006
Vão livre

Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, 1h30 de sábado. Faz frio. O atraso do ônibus é o assunto da conversa dos estudantes que se preparam para ir ao Pantanal. A espera acaba com uma dúvida: "É nisso que vamos viajar?" O velho microônibus não contém nenhum equipamento de segurança. Porta-malas e bancos confortáveis também não estão entre suas características. Se suas pernas têm mais de 50 cm prepare-se para espremê-las durante 6 horas.

Mas, quando a viagem inclui a animada turma de jornalismo 2006, nada é empecilho para diversão: "Toda vez que eu chego em casa a barata da vizinha ta na minha cama... Diz aí Marê o que você vai fazer..." A cantoria segue por boa parte do caminho, até que os combatentes-cantores caem uma a um no sono, mesmo em seus bancos desconfortáveis.

"Eu não quero compromisso, quero namorar", é com a música de Amado Batista no último volume, que acordamos quando o ônibus entra na estrada de chão, já no município de Corumbá. São seis horas da manhã, o Pantanal está amanhecendo. Os tuiuiús, desajeitados com suas pernas grandes, se sacodem em sua magnitude. O jacaré se espreguiça em formato de "U". Eles e os alagados serão familiares de agora em diante.

Garças, pássaros e uma grande ponte sobre o Rio Miranda. Bem-Vindos ao Passo do Lontra. A base da UFMS está logo adiante, com sua estrutura de palafita (casa construída em cima de colunas de concreto, a dois metros do chão). Nos acomodamos nos alojamentos e descobrimos que não éramos esperados. Não havia café da manhã pronto. Para aguardá-lo, vamos para a beira do rio conversar e espairecer. À sombra, num banco de madeira, deslumbramos o paraíso.

Mesmo de cara feia, a cozinheira prepara o café. Depois de comer, vamos à pousada vizinha. Lá, turistas transitam pelas passagens de madeira, construídas em cima dos alagados. Fotos e poses nas passarelas sobre o Rio Miranda. À esquerda carcarás e urubus sobrevoam. A movimentação aumenta, algo de estranho acontece: há um jacaré morto de barriga para cima, um urubu bica seu coro estufado, enquanto os outros animais, inclusive nós, observam.

De volta ao ponto em que deixamos a professora Ruth Vianna não a encontramos. Resolvemos voltar à Base. No caminho, há um trilho e uma espécie de trem que serve para atravessar a ponte de madeira. É nele mesmo que vamos. "Iuupiiii..." Chegando ao alojamento, os pedreiros que trabalham na ampliação do local, dizem que ninguém voltou ainda. Retornamos à pousada e encontramos o grupo. Há um jacaré no alagado. Ficamos a dois metros dele. Ele não se mexe. Parece de mentira, uma estátua. "Ah! Ele piscou!". Jogo uma pedrinha perto dele e ele continua parado.

Agora sim, todos vão para base. Ainda são 9 horas. O tempo das coisas no Pantanal é outro. Tudo é mais devagar, inclusive os ponteiros do relógio. Aqui dá tempo para se viver. Então, vamos dormir e descansar. Levanto quase uma hora da tarde. Desorientado sigo para o refeitório. O grupo conversa e almoça. Despertar e acordar mesmo, no meu caso, só depois de terminar de comer.

À tarde vamos conhecer a comunidade do Passo do Lontra. À beira do rio Miranda, em casas simples de tábua, os moradores vivem longe do resto do mundo. Sem banheiro, sem água potável, sem luz. Os piloteiros-pescadores chegam a ganhar até R$ 2 mil em um mês e no outro podem não ganhar nada. A desilusão dessas pessoas com a melhora do lugar é visível nos olhos e nas histórias de moradores que foram embora. Faço algumas entrevistas para o Comunicação Direta e gravo o encerramento do programa na ponte do Rio Miranda. Mais a frente, uma pousada recebe turistas estrangeiros e cobra fortunas por seus serviços.

Em meio a paisagem encantadora e inspiradora surge o projeto de assessoria para o Passo do Lontra. A natureza mais uma vez surpreende, o urubu que surfa sobre o jacaré morto, já chegou até aqui. Enquanto a correnteza o guia pelo rio abaixo, ela saboreia o jacaré.

Da pousada seguimos rumo a Fazenda Arara Azul, ao som de seu Geraldo, um violeiro singular de 69 anos "Pode ser, pode não ser..." E depois de muitas pontes de madeiras, sobre alagados e jacarés, somos avisados que devemos voltar. Estamos no Rio Abobral, e não daria tempo de chagar na Arara Azul e voltar para o jantar. Criamos uma teoria da conspiração. "Teriam eles nos levado até ali, para nos eliminar?". Inventamos as histórias mais absurdas e rimos.

Logo a frente, mais uma ponte. Em cima dela um bicho de cor parda, imponente. "Uma onça!", grita Marina. O ônibus inteiro se levanta para admirar a rainha do Pantanal. O animal se levanta, assustado pelo ônibus e corre para a mata ao lado. Levanta a perna e mija na árvore. A onça, não passava de um cachorro "que se acha". Retornamos. Atravessamos 30 pontes em menos de uma hora (não é exagero, a gente contou). Em uma delas, o motorista fez todos descerem do ônibus para atravessá-la. Era um terror. Ao descer, vemos uma lontra morta, a única avistada na viagem. Até lobo e bugio vimos, lontra no passo do lontra não. O motorista que tem o apelido de "Ventania" passa pela gente e não para. Ele é cheio das gracinhas, o famoso Joselito sem-noção.

Antes de chegar na base, paramos na conveniência do posto de gasolina. Recarregamos as energias com Skols ou cocas, cada um a seu gosto, e voltamos para nosso alojamento. É hora da fila do banho. Só dois chuveiros quentes, um deles com perereca incluída. Jantamos e depois vamos para a Pousada Passo do Lontra. Lá há sinuca de graça, numa mesa torta, cerveja cara, e espaço para conversas ao ar livre. Na volta, sem sono, brincamos de um "jogo da verdade" que consiste em falar de fatos engraçados da vida do outro. O grande grupo vai dormir e alguns ainda ficam na passarela-sacada conversando e tirando fotos. Finalmente vamos dormir.

Pela manhã do outro dia, café da manhã. Depois, eu gravei mais Comunicação Direta. Aproveitamos e entramos na mata para ver a curva do Rio Miranda. Filmamos a estrutura da base e entrevisto alguns trabalhadores do local. Depois de uma reunião-aula com a professora Ruth, vamos para nosso programa predileto: a pousada vizinha. Todos sentam na passarela de madeira e conversam. Após algum tempo, Jeferson e Bel resolvem conhecer o lugar que há no final da passarela. Eu vou atrás.

Barulhos estranhos de bugio, vento, rio, alagados. "Muitas pessoas morreram construindo essa passarela", dispara Bel. Logo a frente uma placa. "Vão livre, 50 metros". Ela avisa que há uma ponte do tipo "ponte do rio que cai" do Faustão. Atravessamos e fazemos terrorismo com a Bel, balançando a ponte. Um dos momentos mais legais da viagem. Rimos muito. Mais a frente, taturana laranjada pantaneira e cocô de bugio pantaneiro. Depois percebemos que o fim do caminho dá na entrada da pousada, e nos encontramos com o resto do grupo que já estava voltando à base.

Descobrimos que há um prego no pneu do ônibus e que quatro funcionários iriam voltar com a gente de carona, levando suas muitas coisas. Indignação geral entre a galera. Todos arrumam as coisas e reservam seu lugar no ônibus. No almoço, mais música do seu Geraldo. Só ela para aliviar o ardido da pimenta da carne. É escovar os dentes e se despedir da base. Na estrada, o Pantanal se mostra e ainda tem o que ser descoberto por alguns. "Olha o tuiiui, Marina!". Ela era a única que ainda não o tinha visto. E vê dois de uma vez só.

Na estrada, entre reclamações e músicas uma boiada pantaneira. Das grandes. Quase no fim dela, percebemos uma caminhonete cabine dupla que vinha em sentido contrário. As mulheres estão impressionadas com os bois, mas ficam horrorizadas mesmo quando vêem nosso ônibus. Vamos jogando "A palavra é”... O Airton dorme.

Perto de Terenos, cruzamos com um ônibus mais velho que o nosso. É um circo, com desenhos de chapéus mexicanos no ônibus. Atrás, a frase: "Sorria, você está sendo chifrado". A sucata ultrapassando o sucatão foi a cena da viagem. Rimos muito. Quem era o circo? Chegamos sãos e salvos na Capital. As histórias não precisam nem ser contadas para dar risadas, ao ver uns aos outros já começamos a rir. Êta Pantanal...Sim, Vamos Livres!!!

guilherme - 17:03:55
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terça-feira, 25 de abril de 2006

Sem Sentido

"O carnaval de São Paulo vai se igualar ao do Rio em cinco a oito anos", dizia a matéria de uma revista de 1972. A reportagem também constata o fim dos cordões carnavalescos. Falar de carnaval em abril? É hora (quase) de Copa do Mundo, olhe a rua e veja os nacionalistas de verde-e-amarelo. Na TV, os jogadores de futebol fazem comerciais. Nas Casas Bahia, os aparelhos de TV plasma 29 polegadas não duram nas prateleiras. Tudo a 24 vezes sem juros.

Porque comprar? Carioca jamais será como o paulista e vice-e-versa (né Chico?). Não dá e não se deve imitar uma cultura, um ritmo, uma festa. Cada qual tem suas peculiaridades. O feriado serve para recarregar o sono das muitas noites pouco dormidas e para ler um dos muitos livros que estão a sua espera. Também deveria arrumar a bagunça. Mas prefere criar coisas que só ele consome e entende.

Do lixão, a lembrança, a inércia, a matéria por fazer. Falta criatividade? Crise de... Qual era a palavra mesmo? Elas fogem de sua cabeça e se escondem. Não consegue escrever. Relembra o show magnífico a que foi. O êxtase. A realização pessoal. A dança artista e a voz grave da cantora predileta. O vestido rosa cumprido marcando seu corpo roliço. As ondas do cabelo que tem tons mais claros na nuca. A sonoridade da voz, o rosto meigo de expressividade marcante, o carisma, a simpatia. A expressão corporal. A perfeição.

Conhece tudo, sem conhecer nada.

A vida e seu roteiro (melo), suas vivências. O mundo se passa longe de seu mundo. A Rota 66, as florestas, as cachoeiras, a felicidade, os prédios grandes de verdade... A oportunidade de aprender e de modificar realidades não é entendida e acaba "escanteiada". É mais fácil olhar o Orkut...

Na manhã de sábado, a faxina costumeira da qual não participa// Sai. Faz sol, a rua está clara, mais do que o de costume. Mesmo assim não percebe os detalhes, nem repara que não há viva alma fora dos lares. Em uma das casas, música e gente conversando, mas seu destino é outro lugar. Lá também há faxina e a pessoa procurada também fugiu dela. A cara inchada acusa seu estado, acabou de acordar. Volta e vai para Budapeste com escala no Rio. A viagem termina como começa e é intercala por trabalhadores mexicanos engraçados. Dois em um. Diverte-se com antigas histórias repetidas que desta vez são novidades para ele.

A amiga esquecida, a relapsa, a que o julga errado, a que o elogia e a que ele admira, mas sabe que ela vai distanciar. Aquela que ele não sabe definir, a que ele teme procurar, a que ele quer visitar e provar. As relações ele queria poder corrigir, o mundo poderia ser refeito numa folha qualquer com lápis coloridos, a bola de vôlei deslocada, os acontecimentos passam e ele perde. A desilusão com o não reconhecimento. A entrevista que não quer vir. O carnaval de São Paulo que continua querendo ser igual ao do Rio e os cordões que não existem mais e tentam retornar.

Não tente, não há o que entender, não leia (o aviso veio tarde né?). Jogue na lixeira. Só queria passar o tempo e escrever algo qualquer, mesmo que seja tosco... Preencher o espaço.

Até.

guilherme - 12:50:48
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quinta-feira, 9 de março de 2006

Entrevista com Marina Martins



Enfim a segunda entrevista do meu fotolog (blog). Essa é com Marina Martins. (A primeira foi com a Laiana há oito meses atrás). A entrevista foi realizada no dia 10 de junho de 2005 no Centro Acadêmico de Jornalismo (Caju) da UFMS. Desta vez quem exigiu a entrevista foi a entrevistada. Marina me intimou a fazer a entrevista.


A Personagem Marina:

Ela tenta nos remeter para a menina simples, de monocelha, com cabelo à la Chitãozinho e Xororó, de joelhos grandes, com pés descalços e sujos. Mas, o que vemos é uma mulher linda com rosto de menina que para alguns é inimaginável lavando roupas. Apaixonada, responsável, frágil, perfeccionista e inteligente, ela logo nos conquista e faz com que a admiremos.

Porém, a imagem da mulher forte e determinada é apenas uma maneira de proteger a menina carente e completamente dependente da família, dos amigos e do namorado. Dependência afetiva que fique bem claro. Por que é ela que faz a todos ficar dependentes de sua eficiência e companhia.


Confira a entrevista:

Guilherme - Eu quero que você se apresente, fale seu nome, sua idade, aonde você nasceu.
Marina
- Peraí, vamos por partes. Meu nome é Marina Martins eu tenho 20 anos. [agora 21 completos no último dia 13 de novembro]


Gui - Marina Martins?!
Ma
- Marina Martins da Silva. Da Silva do meu pai e Martins da minha mãe. Tenho 20 anos e eu nasci em Iguatemi, uma cidade pacata e bucólica que fica no sul de Mato Grosso do Sul.

Gui - E o que você faz da vida?
Ma
- Eu... Faço faculdade de jornalismo, 3º ano [4º ano agora], eu faço estágio em telejornalismo numa emissora de TV. Faço cursos...


G - De?
M
- Eu faço curso de inglês, no momento é o que eu estou fazendo agora, porque o resto eu tive que parar tudo por caso do trabalho, né? Eu... Que mais que eu faço? Eu faço, eu gosto de fazer artesanato, então eu faço com a minha mãe nos finais de semana. Eu uso esse meu tempo livre pra fazer artesanato e pra mexer com essas coisas que eu gosto.

G - Aonde você faz estágio? É uma emissora de TV, que emissora é essa?
M
- Na TV Guanandi, a TV Guanandi é filial da TV Bandeirantes (Canal 13).

G - Que programa que você faz lá?
M
- Eu faço o "Shopping da Cidade" que é programa de compras, aliás um programa de vendas, que passa às 18h05, todos os dias, de segunda a sábado, vou fazer um merchan e é um programa da TV Guanandi, não é terceirizado, não é enlatado. E eu sou contratada da TV pra fazer esse programa. [Agora Marina trabalha pela manhã no Zoom Rural, no canal 2 da net, e no jornalismo da TV Guanandi]


G - Eu queria você contasse como foi a sua infância. Como você era quando criança? Do que você brincava?
M
- Ai meu Deus, minha infância foi muito feliz passei em toda em cidades do interior, bem pequenas... minha família é muito grande, então vivia rodeada de tios, primos, amigos. Recebi sempre muito carinho, amor, atenção. Minhas brincadeiras eram saudáveis, minhas casas sempre tiveram um grande quintal, com terra, árvores, frutas, lugar pra correr, se sujar também sempre me dei muito bem com meus irmãos, e brincávamos juntos... foi uma infância deliciosa.

G - como você era quando criança?
M
- Bom, fisicamente, parecia mais um menino.,tinha cabelos curtos, sombracelhas grossas, pernas finas, sempre machucadas, magrela. Minha personalidade não era muito diferente do que é hoje, tinha sempre opinião sobre as coisas, era comunicativa, falante mesmo. gostava de liderar as brincadeiras, inventar era comigo mesmo...

G - Do que você brincava?
M
- Brincava na rua, de correr, de pipa, bicicleta, bola, queimada, bandeirinha, carrinho, boneca, de tudo, gostava de ir até as fazendas vizinhas, pra mexer com os bois, sempre gostei de boi, vaca, outra brincadeira, quando fiquei mais velha, era inventar com meus irmãos, programas de rádio, ganhei um gravador,, de tv... fazíamos um jornalzinho...etc

G - Como foi sua adolescência? o primeiro namoro...
M
- como todo adolescente, devo ter sido meio boba, às vezes me lembro de algumas coisas e dou risada. Mas, desde cedo fui muito responsável, fiz cursos e comecei a trabalhar pra ganhar meu dinheiro. mas sem deixar de aproveitar minha adolescência, nessa época, fiz amigos verdadeiros, que estão comigo até hoje, me apaixonei por meu primeiro namorado, e pelo segundo, e pelo terceiro...(risos). Festei muito, aproveitei as novidades, mas sempre com responsabilidade. Nunca fumei, nem usei drogas, nem mesmo maconha. Mas tudo foi válido, fui amadurecendo com cada experiência e escolhendo como eu queria agir pra ser uma pessoa melhor.

G - Porque você escolheu fazer faculdade de jornalismo?
M
- Bom, eu nem sabia o que era um vestibular, mas quando descobri, decidi que ia fazer jornalismo. Eu nem sabia o que queria dizer, isso com uns 12 anos, fui crescendo, gostando de telejornais, de ler, de rádio e descobri que era isso mesmo que eu queria ser, aliás, tudo isso, meu pai me deu o maior apoio e até hoje espera me ver um dia na Globo (risos) me descobri no meu curso e na minha profissão, sou apaixonada pelo jornalismo e pela rotina, nada monótona, da redação, acho que foi isso.

G - Marina por Marina, se defina. Como você é, do que você gosta.
M
- isso é difícil, mas acredito ser uma pessoa responsável, ansiosa, determinada, às vezes aflita demais. Afoita demais, meus defeitos são visíveis: sou estressada, a paciência não é meu forte; muito exigente, perfeccionista e chata. Mas tenho qualidades também: sou carinhosa, amorosa, gosto de dar e receber atenção e sou competente.


G - Como que é sua relação comigo? Como que eu sou? Críticas e elogios.
M
- É uma relação de amor e de ciúmes, eu tenho ciúmes de todos os meus amigos. Ontem eu tive uma crise de ciúmes por causa da Maureen, antes de ontem eu tive uma crise ciúmes por causa da Maria Fernanda. Só que ao mesmo tempo em que eu sou muito espontânea quanto aos meus sentimentos, eu também sou muito fechada. A Maria Fernanda sempre me fala isso, ela sabe o que eu estou sentindo por que ela me conhece, mas eu não deixo transparecer o porquê que eu estou chateada ou o porquê que eu não estou bem. Ontem eu tive uma crise de choro porque a Maureen passou por mim e não me cumprimentou. E às vezes é uma coisa que você se vê tanto que pra você um cumprimento não é importante, mas pra mim é. E a minha relação com você é assim: eu tenho paixão por você, eu adoro ler as coisas que você escreve por que acho que você é muito inteligente. Eu falo para o Luís que às vezes eu tenho uma invejinha, eu já escrevi isso no seu blog, do que você consegue passar pra gente com o que você escreve, às vezes eu estou triste e eu leio um negócio e fico alegre, ou ao contrário. Eu fico pensando, eu começo a pensar nas coisas, eu adoro isso. Adoro seu jeito cativante, seu jeito alegre e o seu jeito de sempre ver uma qualidade nas pessoas, acho que isso é sua maior qualidade. Você consegue ver uma qualidade em todas as pessoas, em todos os seus amigos, talvez eu não consiga isso.

G - E qual é o meu defeito?
M
- Seu defeito? O seu defeito...Cara, qual é o seu defeito? Talvez o seu defeito seja você ser meio arrogante, às vezes você não aceita muita sugestão, e você acha que a pessoa nem devia estar falando com você e a pessoa está te dando uma sugestão e talvez isso seja importante para nossa vida, a gente tentar ouvir as pessoas que estão de fora. E às vezes a gente não ouve. Não que seja um defeito, mas é o que eu me lembro agora.

G - Você é amiga de todo mundo aqui na faculdade, se relaciona bem com todos. Mas, com quem você tem mais afinidade? E Por quê?
M
- Hum, olha, são algumas pessoas, não é uma pessoa. Uma pessoa que, tirando o Luís, o Luís não conta, amigo. Cara, são muitas pessoas, se eu for falar eu vou falar uma por uma porque eu tenho mais afinidade. Mas, as pessoas que eu tenho mais afinidade são: a Laiana. Porque a Laiana é um caso de amor e ódio, sabe? A gente morou junto, então a gente passou por muita coisa junto, eu passei muita raiva com ela, ela passou muita raiva comigo, a gente brigou muito. Mas, eu amo a Laiana de um jeito, cara, tudo que ela faz eu acho engraçado, eu acho o jeito Laiana de ser, eu adoro ela. Eu tenho afinidade com ela por ela ter morado comigo e por a gente ter divido muitas coisas, muitos problemas, muitas alegrias. Ela me salvou duas vezes (risos). Eu não sei se ela falou isso para você.


G - Não, como ela te salvou?
M
- Ela e o Luís. Eu estava morrendo do coração sufocada, eu tenho arritmia, eu comecei a chorar muito, estava chorando, eu não lembro por que. Estávamos nós três, estávamos falando de algum amigo, sei lá, e eu comecei a chorar muito e começou a faltar ar, faltar ar e simplesmente acabou o ar. E eles jogaram água na minha cara, me chacoalharam na janela. Aí eu falo que ela salvou a minha vida. Outra pessoa que eu tenho muita afinidade é a Maureen. A Maureen é a minha irmãzinha, ela foi uma das primeiras pessoas que eu conheci, foi a pessoa que falou assim, ela sempre fala isso, ela se acha (imitando a voz da Maureen): "Ai, você tem jeito pra Televisão, você não quer fazer televisão?". Ela me levou para produtora, ela estava fazendo estágio e eu fui ser assistente da estagiária (risos). A gente ficou muito amiga, esse jeito da Maureen de paty, isso é tudo fachada, a Maureen é uma pessoa maravilhosa, a gente briga demais, porque a gente tem opiniões muito diferentes e a gente disputa. É uma coisa de disputa que eu não tenho com as outras meninas e que ela não tem com as outras meninas, a gente disputa o tempo todo. Talvez quando a gente for profissional a gente vá disputar, ou vá trabalhar juntas. Eu adoro trabalhar com a Maureen, adoro estudar com a Maureen, adoro ser amiga dela. Amo a Maureen porque ela me alegra. Ela que vai atrás de mim. Outra pessoa, eu não posso falar de todos, a Marê, a Maria Fernanda,a Priscilla, a Vivi, a Abelha, a Manuela, a Isabel, com todas elas eu tenho uma certa afinidade, com as meninas é mais a Maureen e a Laiana, por essas questões, e com os meninos é o Gui, você, que eu acho que tenho mais afinidade, por que você tem sempre uma palavra pra animar a gente, toda vez que eu precisei você estava junto comigo, você dividiu as coisas comigo. Eu conto as coisas pra você. As primeiras coisas que acontecem na minha vida eu conto pra Maureen, pra Laiana e pra você. São sempre as primeiras pessoas a saber, quando eu estou desanimada eu conto, quando eu tenho dúvidas, dificuldades. E você sempre me ajudou, foi muito alegre e completa essas horas que não está muito bem, acho que é isso que é ser um amigo mesmo. Acho que são essas três pessoas.


G - É... quase chorei mas tudo bem, rs. Você quer trabalhar com o quê?
M
- Trabalhar?


G - TV, impresso...
M
- Eu quero continuar fazendo jornalismo, que fique bem claro, eu não quero mudar de profissão. Mas, talvez, eu não tenho vontade de trabalhar em impresso, aliás, eu tenho vontade de passar, mas a minha grande vontade, a minha grande paixão, é o telejornalismo. Talvez não apresentando, sendo repórter, nada disso, mas na produção, me identifico muito com a produção de telejornalismo, adoro fazer produção e adoro editar também. Adoro edição, essa parte de produção e edição, acho que vou acabar indo para esse lado. Eu acho que vou largar um pouco, não sei se meu pai vai gostar muito disso, mas acho que vou acabar fazendo isso que é o que eu mais gosto.


G - Como você se vê daqui dez anos? Você vai ter 30 anos, eu quero você fale como você se vê, sonho mesmo, você vai estar casada? Vai ter filhos? O que você vai ter feito?
M
- Cara, eu sempre penso isso de dez anos, dez anos é rapidinho. Daqui 20 anos é mais longe. Eu acho que com 30 anos eu vou estar casada, vou estar casando, porque eu acho que encontrei a pessoa com quem eu quero me casar, e com quem vou ser feliz. Mas, filhos não vou ter, mas também não vou demorar muito para ter filho não, no máximo com 32. Deixa eu te contar uma estatística, não sei se está muito certa, mas, já ouvi.


G - Você assiste Sob Nova Direção (risos)?
M
- Não, mas não é essa da Pitty. Quando a mulher tem 20 anos ela tem 90% de chance de engravidar, quando ela tem 30 anos essa chance cai para 70%, quando ela tem 40 anos essa chance cai para 40%. Então é uma queda muito radical. Esses dias eu estava lendo e não acreditei, mas é verdade, e é muito grande, então se eu deixar pra ficar grávida muito tarde eu posso ter complicações e não ter mais filhos. E eu quero ter muitos filhos, muitos assim, uns três ou quatro, acho que quatro. Depende da minha situação financeira, que eu não quero por filho no mundo sem ter como criar. Mas, acho que quero ter uns quatro e um temporão, porque quando os outros estiverem na faculdade eu quero ter um pequeno perto de mim. Ou pelo menos vou adotar, eu tenho essa vontade adotar e tenho vontade de ter um filho negro, eu sempre quis isso. Minha mãe falava que ia casar com um negão. Então, eu acho que vou acabar tendo três filhos e adotando uma criança.


G - O que você já vai ter feito? Você vai estar em Campo Grande?
M
- Difícil isso. Eu comprei um apartamento e eu tenho que ficar muito tempo em Campo Grande, só que eu não me vejo aqui eu me vejo em outra cidade, casada com filhos, mas em outra cidade. Trabalhando, meu marido também trabalhando. Mas, não aqui em Campo Grande. Vindo em Campo Grande nas férias, talvez Brasília, ou alguma coisa assim. É um sonho, não tenho nada de perspectiva, nada em vista. Eu vejo Brasília, Goiânia, Aqui no Centro-Oeste mesmo, eu vejo isso.


G - Como você vê o jornalismo de uma maneira geral?
M
- Hoje? Ai, Gui pergunta difícil. O jornalismo de maneira geral: melhorou muito tecnicamente, melhorou muito em produção. O jornalismo regional está muito legal, só que quando você começa a estudar você começa a ser mais crítico. Eu assisto hoje ao MSTV, eu não agüento mais assistir, tem horas que eu falo meu Deus o que a gente está fazendo? Porque a gente está fazendo isso. Tanto que esses dias passou um negócio assim: Trabalho infantil lá,lálá,. Eu falei aconteceu alguma coisa, o que aconteceu que eles estão querendo mostrar? Aí que eu fui ver que a Regina Rupe tinha feito não sei o que lá, estavam assinando um documento, aí eles tocam no assunto. Eu acho que jornalismo poderia ser um instrumento social, só que acho que não é, se desvirtuou.

G - Você acha que está muito preso ao factual?
M
- É. Esses dias a gente recebeu uma pauta assim: Estão assaltando muitas lojas, porque vocês não fazem uma matéria sobre a segurança da Capital, diz que a polícia estava envolvida no meio. E o que a gente respondeu? Que não daria para fazer, que era muito rápido o negócio e a gente tinha que fazer a notícia do dia, nem quem a notícia do dia fosse: Morreram tantas pessoas. Porque para o jornalismo hoje você pode ver todos os sites, todos os telejornais, vão dar o mesmo acidente que morreu tantas pessoas. Todos. Ontem, morreram três mulheres na saída para Três Lagoas, tinha várias notícias importantes, várias notícias que poderiam ser mais exploradas, em Iguatemi mesmo apreenderam duas toneladas de maconha, tinha aquela notícia de empresas de captação que foram fechadas, aquilo é muito importante, aquele negócio de compra programada é ilusão, já enrolaram um monte de consumidores, para ele pagar a vista. "Ah, eu estou precisando de empréstimo de R$ 100 mil, tudo bem, mas você vai ter que pagar as taxas administrativas de R$ 7mil, você deposita na minha conta e amanhã R$ 100 mil está na sua conta", então o babacão vai lá e deposita e a empresa some com os documentos, tudo falso, tudo estelionatário. Isso aconteceu ontem, e todo mundo falou que foi preso, ninguém foi a fundo. Era um negócio importante de ser divulgado, mas o acidente teve muito mais repercussão do que isso. Então isso às vezes desanima, mas você sabe que é assim que você vai ter que conviver com isso. É o comércio e o sensacionalismo na TV, o tempo todo.


G - Como você avalia o governo Lula?
M
- Gente que forte! (risos) Governo Lula? Cara, olha vou falar bem a verdade, eu não sou de nenhum partido, mas eu odeio o PT. Eu odeio o PT, não por experiências minhas, mas por experiências da minha mãe. Eu acredito muito na minha mãe, e ela disse que acreditava no Lula, votou no Lula antes, quando eu era criança, e que nada deu certo e que se desvirtuou. E agora o que a gente está vivendo agora, é um partido que é dominante, que está governando o Brasil, que é uma coisa muito importante, um partido que se dizia arrojado, que ai mudanças, nós temos muitas mudanças, vamos ser ousados e lá, lá, lá, e está com a mesma ladainha do governo anterior, dos governos anteriores, está com as mesmas palhaçadas, política não tem jeito. Questão de mensalão, isso sempre existiu, não é só nesse partido é em todos os partidos. Uma vergonha, esses dias a gente estava vendo que deputado vai ter um recesso agora no meio do ano, pra quê que deputado tem recesso no meio do ano? Às vezes eu tenho uma postura até meio radical, eu queria que político não ganhasse nada. Recebesse só lá seu auxílio, um salário normal como de qualquer cidadão, R$ 1000. Por que se a intenção que não foi deturpada, a intenção verdadeira de um político, eu quero ajudar o povo, eu quero fazer pelo povo, então isso aí vem dele, ele não tem que receber por isso. Não tem que receber por isso, não tem que receber auxílio paletó, não tem que receber porra nenhuma. Eles só roubam dinheiro. Eu tenho um negócio com político que assim ,eu não conheço nenhum partido, não vou muito afundo nessas questões, mas eu acho que eu procuro sempre levar é: o social está bem? Não, não está bem. É só com os políticos, talvez não. Eles fazem discurso de paletó, enquanto as pessoas estão passando fome, eles têm auxílio paletó enquanto as pessoas passam fome e não têm onde morar, nem o que se vestir. E ficam fazendo discurso, eu odeio demagogia e odeio hipocrisia. E político pra mim é hipócrita no Brasil hoje.


G - Iguatemi. Você falou que seus pais voltaram a morar em Campo Grande, você acha que Iguatemi nunca mais ou você volta a morar lá um dia?
M
- Não. Eu acho que não volto a morar em Iguatemi, talvez eu possa voltar pra Iguatemi, numa questão assim, eu sempre tive vontade de ajudar Iguatemi a crescer, alguma coisa nesse sentido. Mas, como eu não sou empresária, nem pretendo ser. Talvez eu seja uma empresária, talvez eu instale uma indústria em Iguatemi que ajude a crescer, por que eu tenho um carinho especial por Iguatemi, por que lá é a cidade que nasci, onde meus irmãos nasceram, onde eu tive a minha infância, onde eu passei a maior parte do tempo com meus avós, que a minha avó já faleceu, então assim eu tenho esse carinho por Iguatemi. Mas voltar a morar lá eu acho que eu não volto. Não é que Iguatemi nunca mais, agora com meus pais aqui fica muito mais difícil eu ir pra lá. Eu tenho alguns tios e primos lá, mas é muito mais difícil agora eu ir pra lá. Quando meus pais estavam lá já era difícil. Mesmo assim meus amigos me cobram, a gente vive falando, eles vivem me cobrando, mas tenho vontade sim de ir lá passear, encontrar meus amigos, quando eu tiver um tempo, eu vou com certeza, não vou dizer nunca mais. Mas, com relação a morar e trabalhar não. Agora eu não sei, o futuro, vamos dizer que eu consiga me fazer profissionalmente e tenha condições de dar melhoria para o povo eu vou dar porque Iguatemi é muito carente. É uma roubalheira, a prefeitura é roubalheira, o povo sofre, e o povo é burro, passa fome, mas vai atrás de pessoas que prometem. O povo é ignorante porque não têm professores descentes, essa questão de fazer capacitação de professores. O que precisa em Iguatemi, eu acho que no Brasil todo, é de educação. Nesse sentido, eu ajudaria se eu tivesse condições, tenho vontade.


G - Como é Iguatemi, o que tem lá de bom? A praça, a igreja...
M
- Tudo é bom em Iguatemi. Iguatemi, a praça, na verdade, têm duas praças. Uma praça tem a quadra de futebol, o futebol de areia lá, que é em frente da casa de uma amiga minha, que todos os eventos, carnaval de rua a gente ficava lá na frente da casa da minha amiga, e tem o parquinho, tem a biblioteca da cidade, que é bem pequenininha, mas é lá que fica. E a outra praça é a praça da igreja, que eu passei muito tempo também, que daí tem o salão paroquial. O pessoal não se encontra mais em praça, tem um lugar em Iguatemi onde todo mundo se encontra que chama New Point, que é uma lanchonete, começou com um trailer e todo mundo começou a se encontrar lá, então começou a crescer e virou uma lanchonete grande, e todo mundo que vai pra Iguatemi vai pra New Point, até o Luís já foi pra New Point jogar sinuca quando ele foi lá (risos).


M - Na entrevista com a Laiana ela disse que não conhece ninguém da nossa idade que seja tão responsável quanto você. Da onde vem essa responsabilidade toda?
G
- Ai meu Deus. Eu não sei, foi o que eu te falei aquela hora o que eu achava sobre mim, eu me cobro muito das coisas, sofro antecipadamente, e eu tenho mania achar que eu tenho que carregar tudo que está em volta de mim nas costas. Eu tenho que dar um jeito. Se meu irmão não está bem eu tenho que ajudar, se meu namorado não está bem eu quero ajudar, se a minha mãe está precisando de alguma coisa, eu quero ir lá na casa dela fazer, e ao mesmo tempo eu quero estar trabalhando, quero estar aqui na universidade, sair com quem tiver saindo. E ao mesmo tempo eu quero pagar todas as minhas contas, se eu fico devendo uma conta eu fico enlouquecida, pode ser uma conta de R$ 10. Acho que essa responsabilidade minha mãe me passou, o meu pai me passou, os meu avós, só que eles nunca me cobraram tanto para que eu fosse tão responsável. Eu sinceramente não sei da onde vem essa minha mania e é chato isso. Eu incomodo as pessoas, eu irrito, eu sou perfeccionista e eu sou adulta, eu fui adulta muito precoce, fui morar sozinha, aprender a pagar as contas, trabalhar, fazer compra, lavar roupa, limpar casa, a cuidar do meu irmão que estava doente, tudo isso, sabe? Eu não sei, sinceramente, os meus pais me passaram isso, mas nunca me cobraram tanto. Eu não sei da onde que vem é uma coisa minha mesmo, é pessoal, não sei se meu filho vai ser assim, vou passar os valores para ele. Mas, também não quero que... Isso faz a gente sofrer também, sofre porque a gente cobra das pessoas o que elas não podem dar. Daí você chega em casa e põe a cabeça no travesseiro e pensa que não deveria ter feito aquilo, então se cobra por ter cobrado outra pessoa. Isso é muito ruim, é muito complicado.


G - Você tocou no ponto de morar sozinha, hoje, por exemplo, você mora sozinha por opção, por que seus pais moram em Campo Grande. Fale dos pontos negativos e positivos de morar sozinha.
M
- Os pontos negativos, primeiro, de se morar sozinha: eu odeio solidão, odeio ficar sozinha, então eu não posso ficar sozinha, quando eu estou sozinha eu vou atrás do meu namorado, ou eu vou atrás da minha mãe, ou eu vou pra casa da minha tia, que é super perto, vou ver o Diego, ou eu ligo para minha prima, que é perto também e vou pra casa dela, então eu não gosto de ficar sozinha. Tinha medo de dormir sozinha logo que a Laiana foi embora, eu chorava a noite, sentindo a falta dela. Tem pontos negativos nesse sentido, de você não poder contar com a pessoa o tempo todo. Eu já sentia a presença dela ali o tempo todo, isso é ruim. Agora os pontos positivos. Eu moro sozinha desde que eu sai de casa, eu tinha 17 anos e você adquire uma responsabilidade e você, é engraçado, eu sempre uso esse exemplo, você vai à banheiro, você faz suas necessidades e não tem papel higiênico, você não vai poder gritar para sua mãe, você vai ter que descer e comprar o papel higiênico. É tudo mais complicado, mas ao mesmo tempo é muito engrandecedor, faz você crescer, faz você aprender as coisas, é bom porque você vai arrumando o seu cantinho. Eu como estou comprando o meu apartamento, eu quero comprar as minhas coisas eu fiz a minha cozinha, eu quero fazer o meu banheiro, e isso é muito bom quando você vê que você fez aquilo com o seu dinheiro e que o canto é seu. Isso é muito bom, as pessoas respeitam, meus pais confiam plenamente em mim, plenamente, por eu já morar sozinha, tanto que agora eles mandaram meu irmão para eu cuidar né? Para morar comigo, e eu sou super, coitado do meu irmão saiu uma mãe chata para ficar com uma irmã pior.


G - Quando você começou a gostar do Luís? Qual foi o primeiro dia que vocês ficaram?
M
- O primeiro dia, ai que vergonha, na segunda-feira começaram as aulas, na quinta-feira a gente ficou (risos). Eu o conheci na segunda-feira, aí ele ficou me cantando a semana inteira e eu bobona não estava percebendo, só que eu também o achei bonitinho, daí ele me chamou para ir na festa de um veterano dele, daí eu chamei a Laiana, foi a única que aceitou ir na festa com a gente, daí a gente foi. Eu fiquei muito bêbada, eu tinha mania de ficar bêbada, agora não, e aí eu fiquei com ele. Ele roubou um beijo, eu fiquei brava no começo, mas depois... E no começo eu não queria muito ficar com ele por que eu tinha acabado de terminar um namoro e vim pra Campo Grande pensando vou entrar pra faculdade, não vou namorar ninguém, vou festar muito. E não foi isso que aconteceu, eu festei muito, conheci muitas pessoas, lógico, mas conheci uma pessoa muito importante também, que eu agradeço até hoje. Só que eu só fui perceber isso uns três meses depois quando eu chorei. Foi no dia 1º de junho em um churrasco na casa do Hélio, que daí a gente começou mesmo, a gente já estava namorando, mas foi nesse dia que eu me toquei que eu gostava dele mesmo, que eu queria ficar com ele.


G - Vocês vão se casar, ter filhos?
M
- Vamos. A gente vai casar. A gente faz planos para casar, não agora, a gente está estudando, a gente não tem nada. Mas, a gente fala: eu tenho o apartamento, ele tem o carro. A gente vai casar, a gente tem muita vontade, eu tenho sonho de casar, de ser um casamento diferente, dos meus amigos todos serem meus padrinhos, e a gente vai ter filho, ele vai cuidar dos nossos filhos todos muito bem, ele vai ser um pai maravilhoso, um marido maravilhoso, ele é maravilhoso.


G - O que você sente por ele? O que faz ele ser especial pra você?
M
- Ai, eu vou chorar. Ele é uma pessoa responsável, como eu. Ele é responsável, ele é batalhador, ele é carinhoso, ele me aconselha, me ajuda, sei lá, ele é muito respeitado pelas outras pessoas. Ele se faz respeitar, gosto muito disso nele, ele preza muito o respeito, por mim também, a gente se respeita muito e se ama muito, sei lá, ele é tudo isso e mais um pouco. Ele é um monte de coisa.


G - Você é uma pessoa forte e decidida, mas ao mesmo tempo é frágil e desprotegida, como é isso?
M
- Pior que é, né? É verdade, principalmente quando é pra lutar pelas pessoas eu sou mais forte, eu sou decidida pra ir atrás das coisas que eu quero profissionalmente, mas eu sou muito carente, muito frágil, muito insegura. Muitas vezes tenho insegurança, fico às vezes em dúvida, às vezes eu preciso ligar pra casa da minha mãe pra ouvir a voz dela, pra ela me dar um pouco de força, por que as vezes eu estou lá fazendo tudo dia-a-dia, pagando conta, limpando casa, indo trabalhar, fazendo almoço, levando meu irmão pra faculdade e aí chega no final da noite que eu estou tão cansada que eu começo a chorar, eu quero colo, que eu quero dormir. Tenho vontade de voltar a morar com a minha mãe para não ter mais essas responsabilidades. Que na verdade eu gosto disso, por isso, que eu preciso dos meus amigos, preciso de atenção, sou ciumenta e preciso do Luís né? Ele que me ajuda.


G - Agora é o bate-bola
M
- Eu não vou saber falar, me ajuda...


G - Família
M
- Tudo



G - Um lugar
M
- A minha casa


G - Um exemplo
M
- O meu pai

G - Amor
M
- (imitando voz de criança) o Luís


G - Amizade
M
- Amizade? Eu preciso de amizade, eu preciso dos meus amigos, eu preciso de todos vocês o tempo todo.

G - O Brasil
M
- É lindo


G - Jornalismo
M
- Jornalismo, que difícil. Jornalismo é o que eu quero.


G - Uma qualidade
M
- Sinceridade


G - Um defeito
M
- Mentira


G - Sonho
M
- Me realizar profissionalmente e ser feliz


G - Escrever
M
- Ah! É bom para extravasar, mas eu não sou muito boa nisso (risos)


G - Um momento de alegria, da sua vida
M
- Foi quando eu fiz dez anos, eu vou chorar, que estava todo mundo na minha casa. (chorando). A minha avó, a minha tia, todo mundo que já morreu e não está mais aqui, todo mundo que é importante para mim, meu avô. Foi uma festa linda que era do Bozo e tinha balões, que minha mãe fez no papel vegetal, que eram uns girassóis.


G - Um momento de tristeza
M
- Tiveram muitos, mas eu acho que todos se resumem na morte da minha avó, do meu avô, da minha madrinha, de todo mundo, mas a morte da minha avó que começou.


G - Paterna?
M
- Paterna, foi com ela que começou, foram perdas significativas pra mim.

G - Uma frase
M
- Ah, tem várias, cada uma fala de uma circunstância, depende, mas eu acho que no momento é: "não importa sua idade, nem o tamanho do seu sonho, você pode mais do que imagina..."


G - Um recado final.
M
- Ai, meu Deus, agora Guilherme? Cara, um recado final? Eu quero dizer que eu amo todos os meus amigos e que mesmo com a distância, não daqui de Campo Grande, (chorando) eu continuo preservando todos eles, zelando por todos eles por nossa amizade, e pela confiança que eu tenho nas pessoas, pelo amor, porque eu acho que é o essencial. Eu amo muito minha família, mas eu amo demais os meus amigos, eu preciso deles o tempo todo. Não é só por que eu estou distante, que eu não preciso, eu preciso o tempo todo de atenção, então eu quero deixar esse recado eu amo todos os meus amigos, que sejam todos felizes, perto de mim.


G - É isso, obrigado.

Marina é a filha mais velha de Marcos João da Silva e Celina Maria Martins da Silva. Têm dois irmãos: Marcus Vinicius (Vini) e Marcelo Henrique (Téio).


guilherme - 11:59:51
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