domingo, 6 de junho de 2010

Do sertão para o mar*


- É preciso que alguém cuide dos cavalos - , murmurou Sebastião ao abandonar os animais amarrados e ir procurar alimentos na floresta.
- Mas por quê? -, questionou Eleonor, acreditando que eles ficariam parados, esperando que voltassem.

Depois de 400 quilômetros de cavalgada era natural que eles também quisessem descansar. Após amarrar os animais em árvores, os dois entraram mata a dentro a pé e finalmente ouviram barulho de água. Havia uma cachoeira, árvores frutíferas e fauna diversificada. Era tanta vida que transitava no meio daquele verde que os dois ficaram boquiabertos. O sertão havia ficado para trás.

- Ah, que surpresa! Estava bem longe encontrá-lo -, deliciou-se Eleonor, ao se deparar com o rio e lembrar que pensou em desviar o caminho, pegando um atalho que os levariam em direção oposta.

O casal estava maravilhado com a cena e já sentia que a jornada tinha valido a pena. Ainda não sabiam o quanto teriam que percorrer para achar o mar e nem se conseguiriam chegar até ele em tais condições. Mas esse era o sonho de uma vida, o objetivo de toda uma gente e que a cada dia se tornava mais próximo.

A mulher, no entanto, começava a vacilar em suas metas. Será que achariam o mar? Não era melhor parar e garantir a estadia naquele lugar paradisíaco? Precisavam continuar e arriscar a vida em uma busca em que o resultado era incerto? - Ah! São coisas que sucedem! – respondeu o marido, com a tranquilidade de quem tinha certeza de que o melhor estava por vir.

Sentiram-se plenos com a vista e recarregaram energias, livrando-se das incertezas. Começaram a voltar. Os cavalos se deliciavam brincando com seus rabos. O macho tentava pegar a égua a força, quando Sebastião disparou: - Eh! Que fazes tu, a vagabundear?

Montaram após alimentar e darem água aos animais. O macho maior, marrom e brilhante não demonstrava cansaço. Já a égua tinha cor clara e já cavalgava mais vacilante. O casal também conversava menos. A mulher que antes declamava poesias, entoava cânticos, agora apenas respondia: - Vou ver - , quando o marido questionava sobre o mar.

Estavam há 20 dias na estrada. O tempo tinha sido intenso nesse período. Marcou o casal centenário (ambos tinham 50 anos e já aparentavam 60 com a jornada). Seguiram por uma estrada de chão, passaram por uma boiada e foram vistos às margens de uma BR movimentada. O mar chegou perdendo-se em sua imensidão azul e os chamou. Entraram com animais e tudo. Nunca voltaram a Cacoalzinho, no serão pernambucano.


*Texto produzido como exercício na pós em jornalismo literário. Tínhamos que criá-lo a partir dos diálogos dados pelo professor.
Com o tempo aprendi a publicar mesmo aquilo que não acho bom. Escrever é o que importa.

Entre Aspas: Escrevo uma página de obra de arte e 91 páginas de lixo. Tento por o lixo na lixeira. Ernest Heminguay.

Um comentário:

Jeferson Cardoso disse...

Guilherme, vou contrariá lo, gostei do seu texto. Ao final da narrativa fica a dúvida: o casal morreu afogado no mar ou, simplesmente, não quiseram voltar para o sertão.
Jefhcardoso do
http://jefhcardoso.blogspot.com